ARTIGOS E PARECERES

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Pandemia e seus efeitos nos Condomínios e contratos de Locações de Imóveis.

 

Considerando a situação mundial em relação ao novo coronavírus, classificado como PANDEMIA pela Organização Mundial de Saúde (OMS), levando o Governo Federal, Estadual e Municipal determinar medidas extremas, tornando esse evento epidemiológico de notório reconhecimento público.

 

Ademais, como consequência os Entes Públicos no intuito de reduzir a disseminação do vírus, passaram a recomendar o fechamento de shopping centers, galerias e estabelecimentos congêneres, academias ou centros de ginástica (Decreto Estadual nº 64.862/2020, acrescentado pelos Decretos números 64.864 e 64.865 do ano corrente), bem como outras medidas, de âmbito nacional, que nitidamente impõem a supremacia da proteção da coletividade frente aos interesses e direitos individuais (Lei 13.979/2020, com alterações introduzidas pelas Medidas Provisórias números 926, 927 e 928 do mesmo ano).

 

Fato é que todas essas medidas, apesar de recentes, já afetaram o comércio, prestação de serviços e negócios nos mais diversos ramos da sociedade, todos já sentem significativa perda de receita, presente e futura, e as sequelas danosas da pandemia não atingem somente os empresários, mas também toda classe laboral, circunstância que alcança diretamente o consumo de produtos e serviços, tal ciclo impacta a economia, como se uma pandemia fosse, e deve ser considerado também um evento de notório reconhecimento público.

 

A notoriedade da pandemia e suas consequências econômicas são fatos que no devido processo legal, sequer precisarão de provas, como prevê o Inciso I do Artigo 374 do Novo Código de Processo Civil:

 

Art. 374. Não dependem de prova os fatos: I - notórios;

 

E mais, os negócios jurídicos que, via de regra, têm contrato, verbal ou escrito, tácito ou expresso, NÃO estão imunes aos efeitos da pandemia e suas implicações econômicas, posto que as relações condominiais, locações urbanas de imóveis (residenciais e não residenciais) e compradores e vendedores de bens imóveis, foco deste artigo, igualmente são afetados.

 

O impacto da pandemia no ambiente condominial é amplo, enumeramos alguns, tais como:

 

Mandato do síndico vencido;

 

Fechamento das áreas comuns, restrição de obras e da entrada de prestadores de serviços;

 

Inadimplemento, tanto da cota condominial do mês quanto de acordos já firmados, e ainda obras e serviços paralisados durante o período da crise;

 

Sobre o vencimento do mandato do síndico em virtude do cancelamento/adiamento de assembleias, o que pode culminar no bloqueio de contas bancárias, impedimento no exercício normal do cargo, como demissão e contratação de funcionários, emissão de circulares e outras atividades inerentes, A CONCILIAÇÃO SEMPRE deve ser privilegiada, pois é o caminho mais rápido e “barato” para superação desse cenário incomum, porém, na total impossibilidade e havendo conflito insanável, possível a emissão de procurações com assinatura digital, onde toda massa condominial outorgaria poderes de representação para um grupo reduzido de pessoas, o que permitiria a realização de assembleia presencial, não sendo viável, ainda é possível a realização de assembleias virtuais, em ambos os casos, as regras previstas na convenção do condomínio deverão ser previamente analisadas.

 

Não obstante, se a conciliação não ocorrer e as medidas extrajudiciais não resolverem o conflito ou, se mostrarem inviáveis, ainda será possível se socorrer do Poder Judiciário para obter liminar de suspensão de assembleia de eleição e prorrogação do cargo do síndico, como se vê em vários julgados recentes do Tribunal de Justiça de São Paulo, colocando fim, temporário, ao problema de gestão e representatividade do condomínio.

 

No mais, o fechamento das áreas comuns, restrição de obras e da entrada de prestadores de serviços, fato igualmente extraordinário, o síndico deve buscar o consenso ao menos dentro do Corpo Diretivo, bem como fundamentar sua decisão na convenção de condomínio, contudo na maioria das vezes não encontrará nenhuma disposição que se aplique, posto que o ordenamento jurídico, em especial o Inciso IV do Artigo 1.336 e os Incisos II e V do Artigo 1.348, todos previstos no Código Civil, servirão de amparo legal ao Condomínio, que somado à excepcionalidade e notoriedade da pandemia, convalidará os atos de gestão e representação do síndico quando da tomada dessa decisão:

 

Artigo 1.336. São deveres do condômino:

 

IV - dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.

 

Art. 1.348. Compete ao síndico:

 

II - representar, ativa e passivamente, o condomínio, praticando, em juízo ou fora dele, os atos necessários à defesa dos interesses comuns;

 

V - diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns e zelar pela prestação dos serviços que interessem aos possuidores;

 

Além do mais, o Inadimplemento, tanto da cota condominial do mês quanto de acordos já firmados, e ainda de obras e serviços paralisados durante o período da crise, são problemas que certamente os Condomínios vão se deparar, posto que deverão buscar solução amigável, no intuito de equilibrar as “ações”, pois se de um lado o Condomínio tem total direito de exigir a obrigação, inclusive com os encargos de mora, de outro temos um fato notório, de reconhecimento público e extraordinário, que poderá culminar numa discussão judicial muito mais custosa e com clara possibilidade de ao final do litígio ter a multa reduzida pelo Juiz, conforme prevê o artigo 413 do Código Civil, que deve ser interpretado à luz da “culposidade” indicada no Artigo 408 do mesmo Diploma Legal:

 

Art. 408. Incorre de pleno direito o devedor na cláusula penal, desde que, culposamente, deixe de cumprir a obrigação ou se constitua em mora.

 

Art. 413. A penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.

 

Importante e recomendável que após a superação da pandemia, todos os atos de gestão adotados durante a crise, sejam expostos numa assembleia condominial, bem como ratificados por toda a massa condominial, podendo inclusive ser definida medidas adicionais para recuperar a receita perdida, retomar obras paralisadas dentre outras melhorias deixadas em segundo plano, trazendo não só segurança jurídica para os atos já praticados, como também prevenção de futuras discussões judiciais.

 

Outrossim, nos contratos de locação, seja de imóveis residenciais e não residenciais, bem como nos contratos de compra e venda de imóveis a realidade é bem próxima do que ocorre nos condomínios, ou seja, as partes deverão buscar solução amigável, pois será certamente o caminho menos oneroso no final das contas, os quais deverão se esforçar para retomar o equilíbrio da relação contratual, privilegiando medidas como; suspensão das obrigações por prazo a ser definido de comum acordo, tolerância no atraso de cumprimento de obrigações, abono de multas e até isenção dos juros de mora deverão ser objeto de consenso, tudo aperfeiçoado preferencialmente através de aditamentos contratuais escritos, ajustes esses que evitarão discussões judiciais que visem a redução equitativa das cláusulas penais (Art. 413 do Código Civil).

 

Na impossibilidade de consenso dos contratantes, as partes serão levadas ao Poder Judiciário, onde aquele que deixou de cumprir com sua obrigação contratual, por exemplo, não pagou o aluguel ou o pagou em atraso sem os encargos de mora, poderá se valer das previsões do Artigo 478 do Código Civil para buscar não só o equilíbrio contratual mas para resolver o contrato, isto é, extinguir a relação jurídica:

 

Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.

 

Por sua vez o Locador, seguindo ainda o exemplo do aluguel, poderá, para evitar a resolução/extinção do contrato de locação e consequente desocupação do imóvel, aceitar modificar o contrato de modo a permitir sua continuidade, assim prevê o artigo 479 do Código Civil:

 

Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato.

 

Importante lembrar que as previsões dos artigos 478 e 479 do Código Civil, foram implementadas pela chamada Lei da Liberdade Econômica (nº 13.874/2019), pacote legislativo que visa dar maior autonomia aos contratantes privilegiando e garantindo o livre mercado.

 

Outro ponto que merece destaque é que o coronavírus, classificado como pandemia pela Organização Mundial de Saúde (OMS), tem grandes chances de se caracterizar na jurisprudência futura como uma situação de caso fortuito ou força maior para a maioria das relações contratuais.

 

Dito isso, uma vez demonstrada a conexão entre a pandemia, que como já dito, é fato notório e sequer necessita de prova de sua existência (Inciso I do Artigo 374 do Novo Código de Processo Civil), e o inadimplemento contratual, poderá esse devedor alegar Força Maior como excludente de responsabilidade, nos termos do Artigo 393 do Código Civil:

 

Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.

 

Conclui-se acerca do tópico que os contratos de locação, residenciais e não residenciais, bem como os contratos de compra e venda de bens imóveis, deverão ter seus termos revistos espontaneamente pelos contratantes, através de aditamentos contratuais, preferencialmente escritos, evitando-se maior perda financeira com discussões judiciais, que demorarão muito mais, e ao final ainda se mostrarão demasiadamente onerosas.

 

Por fim, ressaltamos que o ordenamento jurídico não será suficiente para que a sociedade e a economia retomem seu curso normal, portanto, todos os afetados, direta ou indiretamente, pela pandemia e sua inerente crise econômica, também deverão buscar o reequilíbrio das relações contratuais por meio da livre negociação e ajuste consensual, sob pena de padecerem nas vias judiciais.

 

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Erico Antonio

Advogado